Tem certas coisas no Canadá que contando parece mentira para quem não conhece outra realidade que a brasileira. Uma delas é o respeito que certas pessoas têm mesmo fazendo parte de certas categorias estigmatizadas em países terceiro-mundistas, como policiais ou políticos, por exemplo.
Embora aqui também haja corrupção, ela fica dentro de limites bem restritos, e a população pode ver a maioria de seus representantes até mesmo como incompetentes, mas não como corruptos, canalhas, pulhas e ladrões sem-vergonha, meros bandidos, como é o caso no Brasil. Com a polícia, mesma coisa: embora hajam maus policiais, a grande maioria é digna e respeitada. E é por isso que as instituições são fortes e garantem a liberdade, a justiça, a ordem e o bem estar da nação - mesmo que hajam falhas e tropeços de vez em quando.
Hoje ocorreu mais uma demonstração disso. Morreu Jack Layton, o líder do NDP, que é o partido social-democrata, que se saiu muito bem nas últimas eleições, fazendo dele o líder da oposição nacional. Quanto a ele, era um cara que parecia ser genuinamente bacana (apesar de político), e ficou claro como as pessoas realmente ficaram sentidas com a morte dele, depois de vencer a luta contra um primeiro câncer, mas perder a batalha para um segundo, apenas 3 meses após uma grande vitória nas urnas.
É bonito ver os frutos da dignidade neste caso: o verdadeiro amor e admiração que grande parte do povo demonstrou por ele hoje, através de homenagens diversas, com muita gente entrevistada na rua quase chorando! E ficou tudo mais bonito ainda e emocionante quando divulgaram uma carta que ele escreveu à nação poucas horas antes de morrer. Numa atitude bem pragmática, calma, equilibrada e racional - sem nenhum medo ou pieguismo, como é típico daqui, ele dirigiu palavras de otimismo, de idealismo político e muita motivação ao povo em geral. De uma elegância e inspiração emocionantes. E não se esqueceu de deixar um recado a outros doentes de câncer, no qual ele pediu a eles que não se abalassem com a derrota que ele estava prestes a sofrer, nas próximas horas, mas que lutassem pela vida, assim como ele sempre fez, pois a vitória é possível, desde que se lute. Sim, esse cara era político, era decente e realmente gostavam dele. Isso é muito bacana de se ver, e só é possível em alguns lugares, que ainda não afundaram na lama e onde ainda acredita-se na dignidade das pessoas. Parabéns ao Jack Layton e ao Canadá.
7 comentários:
Aqui no BRasil todo mundo que morre vira santo e herói, até o ACM virou santo quando morreu, recentemente o Itamar topete morreu devido a complicações causadas por um linfoma e foi beatificado tb (mostraram até o Sarney chorando no velório dele) achei interessante o recado que Jack loyton deixou serve como um incentivo a outros enfrentarem a doença. Aliás aqui no Brasil todos os políticos doentes são tratados nos 2 melhores hospitais particulares de São Paulo, obviamente com dinehiro público.
Viram santos na midia, né... pq eu nunca ví ninguém sentido pq algum FDP desses morreu. Talvez o Vargas.
Alex, você sabe dizer se este senhor professava publicamente algum tipo de fé?
Eu não sei se ele tinha alguma fé religiosa, pois isso aqui não é assunto que se deva discutir e nem se usar como ferramenta política. Nunca ouvi nada sobre isso. Mas, pelo menos aparentemente, não.
Legal. É que eu estava pensando em como é interessante ver alguém lidando com a morte com certa naturalidade, principalmente se não tiver uma motivação religiosa por trás. Se esse fosse o padrão a maioria das religiões perderia a razão de ser.
Rosana, é por essas e outras q religião aqui não tem importância. Como as pessoas são equilibradas e pragmáticas, não ficam buscando alívio em superstição. É muito comum a gente ver essa postura aqui perante a morte. Esse cara era famoso, mas eu vejo gente comum com a mesma atitude. Uma cultura mais baseada na razão permite que isso seja normal. Não há mistério e nem desespero nos fatos da vida.
Enqto isso, no Brasil por exemplo, até as pessoas mais religiosas, temem a morte e se desequilibram (coisa que não deveria ocorrer se a fé realmente oferecesse alguma certeza a elas).
Pois é, mesmo para exercer a fé há que se ter coerência. Mas sabemos mesmo que esse não é o forte daqui, em todos os aspectos.
"Uma cultura mais baseada na razão." Utopia pura.
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