Às vezes certos fatos nos levam, num certo momento, a estruturar impressões e análises espontâneas e aleatórias que temos ao longo do tempo.
O que aconteceu em Vancouver esta semana teve este efeito em mim. O fato em si não causou a análise (na verdade as várias que ocorreram, de forma pulverizada, ao longo de muito tempo) mas serviu apenas como gatilho para a estruturação das mesmas.
Tal análise se refere à cultura local que, na verdade, pode ser generalizada como a cultura norte-americana, apesar de certas diferenças inter-regionais que podem ser marcantes em certos momentos. Entretanto, como já escrevi bastante sobre as diferenças culturais dentro contexto norte-americano que fazem o Canadá diferente dos EUA, hoje vou me focar no que há de comum, ao meu ver, e não me agrada muito.
Começando pela questão do público versus privado, com total ênfase no segundo, que torna as pessoas alienadas do seu ambiente social e refratárias, de uma forma antipática, ao contato humano "natural" e espontâneo. Depois há um formalismo (que parece informalidade por não ser burocrático) que acaba sendo idiota muitas vezes. Terceiro: a total falta de sensualidade e "joie de vivre" que, aliada ao primeiro fator citado, torna as pessoas desinteressantes e pouco atraentes (mesmo as bonitas), por sua postura "rígida". Junte-se a isso tudo o excesso de controle, regras e zelos ideológicos e receios diversos no contato interpessoal, que torna a vida meio sem graça, muito previsível e os relacionamentos artificiais. A atitude "não me importo com você", tão característica de culturais individualistas, às vezes chega a ser detestável. Nota-se pessoas com repulsa a pessoas, só que sem um motivo misantrópico inteligente (o que faria tal repulsa aceitável). A polidez distante e uma cordialidade forçada são empregadas para atenuar tal traço, mas sem muito sucesso, quando se olha criticamente.
Por fim, temos a alienação, a imaturidade (novamente pouco perceptível) e o tédio dos jovens, causados por uma criação muito controlada e pela segurança generalizada disponível em sociedades abastadas e bem organizadas. A simplicidade mental e total alienação inesperadas (pois as pessoas são muito autoconfiantes, assertivas e autônomas), também pode surpreender. Outros pontos breves são: a obsessão pelos valores, estrutura e convívio familiar nos moldes capitalistas, o politicamente correto institucionalizado, o consumismo, a massificação, uma educação muito pragmática e técnica, o puritanismo e a aversão à sexualidade - em diferentes graus de disfarce, a ética produtiva protestante - agora laica porém ainda presente, e muitas outras coisas que fizeram o continente rico, livre, poderoso, pujante, porém, "chato" e sem sabor.
Por outro lado, há também o lado bom tanto nas características, valores e resultados dessa cultura, que é o que nos traz para cá, e que ainda faz valer a pena estar aqui. Mas, sem idealização ou deslumbramento, que acometem tanta gente "comum", pelo menos nos primeiros tempos.
No meu caso, mesmo quando me foco apenas no lado negativo daqui, eu ainda não tenho vontade de ir embora e nem saudades do Brasil, pois não me esqueço do lado ruim de lá - isso é o que acontece com gente menos analítica, que tende a idealizar ora o lugar onde estão, ora o lugar de onde saíram e, a partir daí, adotar discursos e atitudes saudosistas ou revoltadas. Ah, e outro ponto que pesa muito a favor daqui é o aspecto físico, muito belo e agradável. Inigualável.
Resolvi estruturar e partilhar estas ideias tanto como exercício intelectual quanto como registro pessoal. E sei que pouca gente vai entender. Por fim, esclareço que a aparente insatisfação com aspectos humanos locais não é nada demais e nem decepção, pois eu não tenho ilusões com a humanidade em geral e sempre evito mesmo o convívio e a ideologia comuns, tão simplórios, repetitivos e desinteressantes, onde quer que eu esteja - e especialmente porque considero o conjunto ainda pior no Brasil. Mas fica um desejo de continuar buscando ambientes mais ricos ou pelo menos excitantes no que se refere à experiência humana e ao conhecimento. Europa?
2 comentários:
Cara este "riot" en Van me deixou abismado, não acompanhei bem pela imprensa aqui, as vezes aqui na selva acontecem coisas assim (principalmente qdo os corintianos perdem hahaha) pelo menos por ai parece que a policia vai fazer alguma coisa (incrível aqui no Brasil vc pode simplismente fechar as delegacias pois a polícia faz cada vez menos)
Acho que vc é realmente um cidadão do mundo e talvez isso Van combine tanto com vc por ter cidadão de varias outras partes e fazer parte do mundo civilizado, mas eu tento imaginar quais seriam suas impressões vivendo em outros lugares como países nórdicos ou o extremo oposto paises muçulmanos, já se imaginou nestas situações??
Esse lance chocou todo mundo. Foi bizarro acontecer essa selvageria mas, as reações foram bem diferentes do q teriam sido na selva.
primeiro, pq haverão punições. Segundo pq muita gente tá se apresentando á polícia voluntariamente.
Acho q ainda falta muito p/ eu me considerar cidadão do mundo, pois ainda sou totalmente ocidental (e pretendo continuar assim) hehehe.
Mas tb me imagino em outras "dimensões". Na Europa seria tudo muito parecido, apesar das diferenças. O estilo de vida e ideias seriam quase os mesmos.
Já numa cultural medieval, teocrática, imagino q até possamos viver bem, se tivermos dinheiro, e voltarmos nossa vida totalmente p/ o privado. Mas prefiro nem experimentar...
Já, Europa sim... um pouco mais de sofisticação cultural seria interessante.
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